sábado, 14 de agosto de 2010

Senso ao Censo 2010

O matemático Marcos Cavalcanti em sua coluna em O Globo reclama do Censo 2010.

Concordo com ele de que seja uma falha que o sistema do questionário informatizado não permita a opção de não se declarar a raça. Mas não é verdade que o censo não procure saber sobre a escolaridade. No formulário da amostra há o item.

Por que a escolaridade é perguntada apenas na amostra e não no censo padrão? O censo padrão procura fazer um levantamento da população *total* - saber exatamente quantos brasileiros existem (e exatamente quanto estão em determinadas condições, como moradia). A amostra pega apenas parte do universo total.

Naturalmente, realizar o censo é mais caro do que realizar a amostra. Pegar a população total envolve ir a cada cidade, em cada residência - é necessário treinar um número muito grande de recessenceadores, equipá-los adequadamente, garantir o transporte... Na amostra, pega-se um total muito menor. Por isso, o censo é realizado apenas a cada 10 anos. Já a amostra é realizada anualmente (a PNAD - pesquisa nacional por amostra de domicílios).

A PNAD é boa, assim, para mostrar tendências - mas, não captando toda a população, tem, claro, um certo erro embutido. Não que o Censo seja livre de erro, porém, em termos estatísticos, tende a ser insignificante. O Censo, então, é melhor para nos fornecer dados a respeito de grandezas que evoluem mais lentamente no tempo - a população varia de tamanho, mas sua taxa de variação tende a não ser tão brusca, então interpolações entre os dados dos censos e extrapolações entre o último censo e o próximo tendem a ser mais seguras.

Algumas variáveis, como o tamanho populacional, são cruciais para muitas políticas - p.e., as cotas do fundo de participação dos municípios são definidas pelo tamanho populacional de cada localidade. Mas, como dito antes, medir o exato tamanho populacional envolve custos proibitivos para a realização entre intervalos mais curtos. E, felizmente, como dito acima, é de previsão mais fácil e confiável. Além disso, por amostragem, quase não faz sentido estimar-se o tamanho populacional total - a amostragem é feita com base em um certo número de residências e não por uma certa área geográfica.

Saber a raça e etnia é fundamental para políticas como de combate à discriminação de minoriais étnicos-raciais. E, no caso dos indígenas, é importante saber como sua população evolui - são, afinal, descendentes dos habitantes destas terras antes da invasão pelos colonizadores: há uma dívida histórica de contínua expropriação por nossa parte. No caso da população negra, há também uma dívida histórica de exclusão socioeconômica.

E no caso da escolaridade? É uma informação de alguma utilidade, mas saber *exatamente* quantas pessoas têm x ou y anos de estudos não é fundamental. É mais importante saber a *proporção* de pessoas que têm x ou y anos de estudos. Por isso o sistema de amostra funciona bem. Além disso, o MEC tem informações a respeito de exatamente quantas crianças de z anos estão matriculadas no w ano escolar. Com a informação sobre o tamanho populacional total de crianças de z anos que é obtida no censo, é possível saber quantos porcentos de crianças de z anos estão matriculadas no w ano escolar; essa informação é mais importante do que saber quantos adultos têm 20 anos de estudos.

Tendo Cavalcanti formação em matemática é um tanto estranho que isso lhe tenha escapado.

Upideite(16/ago/2010): Na reportagem da Folha, o IBGE esclarece parte da questão.

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