quarta-feira, 20 de maio de 2009

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(Esta postagem deverá sofrer atualizações posteriores.)

Abaixo algumas afirmações e negativas (ainda) frequentes entre os opositores mais veementes das cotas raciais (para acesso ao ensino superior).

+ Cotas irão aumentar o preconceito contra os negros, acirrar os ânimos e a tensão social.
A) Vamos supor que aumentem. A culpa é dos preconceituosos, não das medidas. Seria o mesmo que dizer que não se deve instalar iluminação em um bairro porque os criminosos que ali atuam não irão gostar.
B) Cotas - e políticas de ações afirmativas - não visam a combater o preconceito. Visam apenas a equalizar as condições de acesso aos recursos sociais.
C) Não há nenhum indício sólido de que as cotas aumentem o preconceito contra os negros. Ao contrário, o instituto Datafolha apurou em duas oportunidades o apoio da população às cotas para negros nas universidades. Em julho de 2007, 65% dos entrevistados declararam ser favoráveis às cotas para negros (e 87% para as pessoas de baixa renda); em novembro de 2008, 62% declararam concordar que "as cotas para negros nas universidades são fundamentais para ampliar o acesso de toda a população à educação". Em outubro de 2003, a Fundação Perseu Abramo fez uma pesquisa sobre cotas e 59% dos entrevistados concordavam (total ou parcialmente) com a reserva de vagas para negros no estudo e no trabalho (em 1995, 48% concordavam total ou parcialmente). Em janeiro de 2013, 62% dos brasileiros eram a favor de cotas em IES públicas para negros, pobres e alunos de escolas públicas (64% eram favoráveis a cotas que só considerassem a raça autodeclarada).
C1)** Há estudos que indicam uma *diminuição* do preconceito com a exposição à diversidade étnico-racial-cultural (hipótese do contato). Para uma revisão: Paluck & Green 2009.

+ Cotas diminuem a qualidade do ensino.
A) Pesquisas indicam que, de modo geral, os cotistas apresentam um desempenho acadêmico igual ou superior aos não-cotistas.
Na UFBA, em 11 dos 18 cursos mais concorridos, os cotistas tiveram desempenho igual ou superior aos não-cotistas.
Na UFPR, os cotistas raciais tiveram, na média, um desempenho pior nos dois primeiros anos de avaliação: índice de rendimento acadêmico dos cotistas raciais - 53% -, de não-cotistas: 62%. Por outro lado, o abandono de curso foi menor: 4% dos cotistas raciais contra 11,2% dos não-cotistas.
Na UnB, em 27 cursos os cotistas raciais tiveram um desempenho superior; em três, o mesmo desempenho e, em 31, um desempenho pior. Quanto à evasão[5], os cotistas apresentam uma taxa não superior ou inferior: 8% contra 10% de não-cotistas em um período de 1,5 ano para ingressos em 2004 (subindo para 15,7% contra 17,5% em 2,5 anos), para ingressos em 2005, em um período de 1,5 anos, as taxas foram: 9,7% contra 16,1%.
Na Uerj*, os cotistas tiveram um desempenho acadêmico praticamente igual (ligeiramente superior) aos não-cotistas: 6,74 contra 6,71 de nota média.
Na UFABC*****, os cotistas, em geral, tiveram um desempenho médio similar (ligeiramente inferior) aos não cotistas: 1,99 de coeficiente de rendimento acadêmico contra 2,11. Os cotistas raciais tiveram um desempenho menor: -35,4% (pretos cotistas), -17,6% (pardos cotistas), -17,2% (pretos não-cotistas), +14,0% (brancos não cotistas), +10,2% (amarelos não-cotistas).
Na UFRGS****, os cotistas raciais (advindos das escolas públicas) que entraram em 2008 tiveram um desempenho pior (maior tempo de integralização do curso) e maior taxa de evasão do que os não cotistas de escolas públicas e não cotistas que não se declararam negros. (Não encontrei os valores.)
Na Unifesp6,  cotistas tiveram desempenho médio 1,26% inferior aos não-cotistas; em cursos do câmpus de São Paulo-SP o desempenho médio foi 6,65% inferior; nos do câmpus de Santos-SP, o desempenho foi 8,71% superior.
No Enade 20086, cotistas (e beneficiários de bônus) tiveram um desempenho médio 9,3% inferior aos não-cotistas. 10% inferior no caso das estaduais paulistas.
Na Unicamp***, que usa o sistema de bonificação em lugar de cotas, os contemplados por critérios sociais (escolas públicas) não tiveram diferenças de desempenho; os bonificados por critérios raciais obtiveram um desempenho pior: 16% de reprovação contra 10% geral e 28% de abandono contra 24% geral.
(Esta argumentação era mais frequente antes da implementação mais ampla das cotas e do surgimento desses estudos. Atualmente é menos sacada, mostrando como dados claros podem ajudar no debate.)

+ Os cotistas não conseguirão emprego por serem considerados inferiores.
Não há distinção na diplomação a respeito de se se trata ou não de aluno cotista. Mas poderia haver uma desconfiança geral - mais facilmente voltada contra os negros -, é preciso estudos para se verificar isso e alguns começam a ser feitos com os cotistas formados.
Na UFRGS7, os egressos cotistas sociais e raciais do curso de Ciências Jurídicas e Sociais estão no mercado dentro de sua área de formação, e relatam não sofrer preconceito.

De todo modo, se houver discriminação contra cotistas/beneficiários de programas de ações afirmativas, o problema tem origem no mercado, não nas ações afirmativas. Eventuais soluções deverão ser encontradas para se impedir essa discriminação e não simplesmente acabar com as políticas de ações afirmativas.

+ Devemos utilizar cotas sociais no lugar das raciais, já que os negros estão mesmo em maior número entre os mais pobres.
Números do Inclusp7 mostram que, entre os beneficiados do programa de inclusão de alunos de escolas públicas na USP, ocorre uma desproporção ainda maior entre brancos e negros do que entre os aprovados na Fuvest que não são beneficiados pelo programa.

O uso exclusivo de cotas sociais pode, assim, agravar ainda mais a exclusão dos negros.

*Upideite(04/fev/2011): adido a esta data.
**Upideite(05/fev/2011): adido a esta data.
***Upideite(30/abr/2012): adido a esta data.
****Upideite(01/ago/2012): adido a esta data.
*****Upideite(13/ago/2012): adido a esta data.
5Updeite(09/abr/2013): adido a esta data.
6Upideite(19/mai/2013): adido a esta data.
7Upideite(23/set/2016): adido a esta data.

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