quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Zero tom de verde - capítulo 5

Esta é uma obra de ficção. Qualquer coincidência com a realidade será mera semelhança.


(Capítulo 1 aqui.) (Capítulo 4 aqui.)
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O professor da USP arrancava gargalhadas da plateia.

"'Fessô, fessô', era assim que ele me chamava. 'Fessô, mas como que pode, como é que pode o efeito estufa não existir?' Eu: 'Não é que o efeito estufa não exista. Ele existe. Mas na estufa. Agora a Terra.' Alguém aí na plateia já viu se no céu tem paineis de vidro? Não tem. A Terra é aberta. Então não é uma estufa. Quem já viu uma estufa aberta? Pelo jeito só os aquecimentistas alarmistas. E tem mais. Olha esta foto. O que é?"

Todos os presentes em uníssono: "Uma estufa."

"Cês tão colando, hein?"

Risos.

"Muito bem, é uma estufa. Vocês estão afiados. Podem ser alunos da USP. Depois desta palestra podem passar lá na secretaria de graduação do instituto pedir o diploma."

Mais risos.

"Aqui, aqui.", frisava com a luz do laser, "Aqui é um gráfico de temperatura. É a temperatura desta estufa. Vejam, a curva sobe e desce. De dia, quando a luz do Sol bate, a temperatura da estufa aumenta. À medida em que o Sol vai subindo, subindo, a temperatura sobe junto. Aí o Sol vai baixando e a temperatura vai caindo. Chega à noite e a temperatura continua caindo. E vai voltar a aumentar. Ela, a temperatura, sobe e desce, na verdade fica oscilando e não sai do lugar. A temperatura média dessa estufa é de cerca de 30oC. Isso no verão. Ao longo do ano varia um pouco. O que a estufa está fazendo. Comparem com a temperatura de fora da estufa ao longo do dia. O que a estufa está fazendo é que a temperatura dentro oscila menos. Desculpe-me pelos detalhes aborrecidos, mas o que quero é que vejam como a temperatura se comporta em uma estufa."

E começou uma coreografia ondulando sua mão esquerda na horizontal, depois a mão direta.

O público ria.

"Agora veja isto aqui." Era o famoso gráfico de taco de hóquei.

"Nada a ver com aquele outro, né? Esse gráfico aqui é o que os alarmistas dizem que representa a temperatura da Terra. Se for um gráfico verdadeiro, é de um forno, não de uma estufa. Os aquecimentistas devem botar a plantinha que eles têm na casa deles, um vasinho de petúnias, botar no forno e aí coçam a cabeça: ué, minha flor morreu queimada. Eles não sabem a diferença entre um forno e uma estufa."

Gargalhadas e aplausos.

"Mas além de tentarem assar um frango na estufa, os alarmistas mentem. Vejam isto." O gráfico anterior do taco de hóquei se expandia temporalmente, apresentando a oscilação registrada da temperatura até cerca de 30 mil anos atrás.

"É o real gráfico da temperatura da Terra desde o último máximo glacial. Vejam como a variação da temperatura é muito maior do que nesta pontinha aqui onde estamos. Ou seja, não tem aquecimento nenhum."

"O que foi, meu bem? Não está gostando da palestra do professor Ricardo Rizzo?"

"Não, não é isso, George. Estou só pensando a respeito das coisas."

Flora tentava absorver aquilo. Estava em franco constraste com o que lhe ensinara o professor de biologia no colégio. Mas claro que um professor doutor da USP saberia muito mais. Sobretudo tendo feito pesquisa no Ártico. Ao menos era o que se informava o minicurrículo apresentado no material impresso daquele evento: "Orgulhosamente patrocinado pela GC Foods, que acredita no futuro do país e investe na pesquisa nacional."

Sentiu um calafrio. Era o ar-condicionado a toda. O salão parecia uma geladeira, deixando a todos os presentes confortavelmente protegidos do inferno lá fora: um veranico que durava já toda a primeira metade do inverno, 40oC a sombra.
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(Capítulo 6.)

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